domingo, maio 07, 2006

MARIA JULIETA DRUMMOND DE ANDRADE

O destino pode nos trazer agradáveis surpresas, como aquela que fez nascer uma boa amizade entre nós e Maria Julieta Drummond de Andrade.
Tínhamos fixado residência na Tijuca, no Rio, e passamos a acompanhar o trabalho da filha de Carlos Drummond de Andrade que, seguramente, havia herdado os dotes literários do pai famoso.
Em um dos artigos por ela assinados em "O Globo", ao se referir à época clássica, lançou um desafio, para saber quem seria capaz de fazer uma SEXTINA que, como sabemos, tem complicada estrutura.
Usando aquele espaço do jornal, a cronista publicou uma, de sua autoria, "apenas como exemplo", como ela mesma acentuou.
Observando um momento de folga, também elaborei uma sextina, a tempo de enviá-la para Maria Julieta, no mesmo dia do "desafio".
Levei a carta ao correio e fiquei aguardando o resultado...
Houve, no entanto, uma série de emprevistos e, dias depois, recebi a carta de volta, com a anotação PESSOA NÃO IDENTIFICADA, impressa no envelope, feita pela recepção do jornal "O Globo".
Apesar disso, não desisti e, sem abrir o envelope, escrevi outra carta para Fernando Sabino, narrando o ocorrido e pedindo que a assessoria do também famoso escritor encaminhasse a carta que havia voltado, para Maria Julieta, grande amiga de Sabino.
Restava-me esperar mas, com a demora, a esperança de alcançar meu objetivo foi se diluíndo.
Mas, meses depois, qual não foi minha surpresa ao receber, da Embaixada Brasileira da Argentina, uma gentil correspondência de Maria Julieta que fazia elogiosas referências à minha sextina.
Em princípio, julguei que aquele cartão fosse apenas uma atitude de gentileza mas, com o passar do tempo, pude verificar que não era bem assim!
Semanalmente quase, passei a receber, de próprio punho da escritora, várias publicações, em que ela buscava um comentário, um opinião que fosse, tanto em relação ao conteúdo quanto à forma de algumas delas.
"Un Solo Amor", foi uma dessas obras, uma antologia bilingue de Odylo Costa Filho, com belíssimos sonetos, em perfeitos decassílabos, uma verdadeira jóia da poesia mundial, rica em lirismo, como tive ocasião de comentar com a amiga.
Sempre que ela ia ao Rio de Janeiro, Maria Julieta entrava em contato conosco e, lá da Barão da Torre, ela se mostrava surpresa com o tipo de atividade que exercíamos, completamente dissociada da literatura ou mesmo daquilo que se poderia chamar "de relevância cultural"...
Todos os contatos que mantivemos foram bastante enriquecedores e mostraram uma mulher de altíssimo nível cultural, que não se conformava em ter o nome, na esfera literária, irremediavelmente ligado ao pai internacionalmente famoso.
E tanto isto era verdade que, em suas derradeiras crônicas em "O Globo", passou a assiná-las sem o "Drummond de Andrade", na tentativa de se livrar das nem sempre pertinentes comparações.
Tinha ela voltado para o Brasil, deixando a Diretoria Cultural da Embaixada Brasileira em Buenos Aires, quando adoeceu e após severo tratamento, ela nos deixou, legando a seus leitores uma obra que tem a mesma luz da obra paterna, completada com a doçura da alma feminina...
A morte de Maria Julieta Drummond de Andrade foi um duro golpe para o coração do pai que, dias após, também partiu, naquele ano de 1987 em que perdemos uma dileta amiga e o Brasil ficou, definitivamente, mais pobre...
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